abril 15, 2014

CARLOS LACERDA: "UN UOMO QUALUNQUE?!?"

Carlos Lacerda:
“un uomo qualunque?!?”


1966 - Participei do lançamento do livro "Crítica & Autocrítica", de Carlos Lacerda em pról da Frente Ampla pela volta do país ao Estado de Direito.

CENTENÁRIO DE CARLOS FREDERICO WERNECK DE LACERDA (30/04/1914-30/04/2014)

Com certeza, Carlos Lacerda, NÃO foi “un uomo qualunque”! Ele foi um líder. Ele soube fazer a sua hora. Ele soube mandar a sua mensagem. Ele fez e participou da história de seu país...
Ele sempre reconheceu o preço que teve que pagar por ser ousado: “No primeiro momento da FRENTE AMPLA (com Jango e Juscelino) perdi quase todos os amigos e apoio político. O primeiro momento foi uma coisa parecida como quando rompi com os comunistas, sobretudo os fanáticos...”(in “Depoimento”, 1978).

RESUMINDO: O histórico da vida e da importância de Carlos Lacerda requer páginas e páginas... Vamos apenas destacar 2 posicionamentos que fizemos: um comentário que fiz ao post “Ainda Carlos Lacerda e as Culpas”, do Blog de Reinaldo Azevedo/Veja e o registro de sua passagem por Botucatu/SP, como Paraninfo das Professorandas da Escola Normal. Esses 2 posicionamentos refletem, bem, a postura política e idealista de Carlos Lacerda:








1º POSICIONAMENTO:

Armando Moraes Delmanto
03/09/2010 às 8:57
Carlos Lacerda teve 2 momentos marcantes em sua vida que o diferenciavam de “un uomo qualunque”: o primeiro, em 1935, qdo bastava que se acomodasse após ser o orador oficial do Manisfesto Comunista da Aliança Nacional Libertadora, como porta-voz do líder Luiz Carlos Prestes – transformando-se na grande promessa jovem do movimento comunista! – e continuasse atrelado ao cabresto rígido do Partidão; o segundo, em 1964, qdo bastava que ele se acomodasse após a vitória do movimento militar, do qual era o maior líder civil e candidato a Presidente da República, em 1965, e que continuasse engajado ao esquema da Revolução Militar que, dia a dia, se distanciava dos compromissos iniciais, para que tivesse um futuro melhor…
A verdade é que Lacerda nunca se acomodou e, se não fosse corajoso e não ousasse romper as amarras aveludadas do comodismo que estabiliza a vida das pessoas na mediana mediocridade de uma existência sem sustos, sem riscos e sem lutas…
Não dá para comparar Serra a Carlos Lacerda, como tem sido feito por alguns bloguistas…
Quem sabe do histórico da criação do PSDB (p/ se contrapor ao PMDB desonesto de Quércia, etc) e agora ver Serra rasgando elogios a Quércia, saí de cena…
Que saudades de líderes como Carlos Lacerda!
Tô fora!
Que país é este?!?

2º POSICIONAMENTO:
 REGISTRO HISTÓRICO :

 Nos anos 50 e 60, a ESCOLA NORMAL atingia o auge do prestígio educacional. Mesmo com seu nome alterado para INSTITUTO DE EDUCAÇÃO "DR. CARDOSO DE ALMEIDA". E o prestígio da nossa Escola Normal  transformava a cidade de Botucatu em palco privilegiado do mundo político nacional.
Assim, em 1963, as professorandas tiveram como paraninfo o Sr. Laudo Natel, Vice-Governador do Estado de São Paulo. E, em 1964, as formandas escolheram o Governador do Estado da Guanabara, Carlos Lacerda. Era simplesmente o político mais polêmico do país e candidato a Presidente da República nas eleições de 1966 (que seriam adiadas e transformadas em eleições indiretas pelo Regime Militar).
Por aí dá para se ter uma idéia da importância nacional da tradicional Escola Normal de Botucatu! Em todas as solenidades nos anos anteriores, sempre o Paraninfo escolhido era um cidadão das mais altas qualificações, quer fosse da cidade ou da capital ou de outro estado.
Carlos Lacerda durante sua vida, por duas vezes esteve em Botucatu. A primeira vez, nos idos de 1935, quando procurado pela polícia, após sua participação no grande evento que foi o lançamento do Manifesto Comunista por Luís Carlos Prestes, quando Lacerda fora o Orador Oficial. Nessa ocasião, Lacerda abrigou-se por uns dias na Fazenda do Sr. José Augusto Rodrigues, conforme depoimento do mesmo. Na segunda vez, em 1964, já então Governador do Estado da Guanabara (Rio de Janeiro), Lacerda veio paraninfar asProfessorandas do Instituto de Educação "Dr. Cardoso de Almeida". A notícia da solenidade, publicada no jornal "O ESTADO DE S. PAULO", de 22/12/1964, nos dá uma idéia de sua presença entre nós, ciceroneado por Antonio Delmanto (presidente municipal da UDN) e pelo Deputado Estadual Roberto de Abreu Sodré(presidente regional da UDN):
"...O Governador dirigiu-se juntamente com sua comitiva à casa do Sr. Lourenço Ferrari, para se preparar para a cerimônia de formatura dos professorandos do Instituto de Educação "Dr. Cardoso de Almeida", e às 20 e 15 chegou ao Tênis Clube onde se realizaria a cerimônia. Além do governador Lacerda, fizeram parte da mesa Dom Henrique Golland Trindade, Arcebispo de Botucatu; dep. Herbert Levy; cap. Armando Siciliano, da junta de Recrutamento local; José Pedretti Neto, patrono da turma; Benedito Mendes de Almeida, inspetor regional; Octacílio Paganini, presidente da Câmara; Joaquim Amaral Amando de Barros, prefeito de Botucatu; Waldir Danziato, diretor do Instituto de Educação e Roberto de Abreu Sodré, presidente da UDN Regional."


"Na ocasião, Lacerda discursou sob rara inspiração, tanto que no final, encerrando, dom Henrique lembrou "...que aquele ginásio, palco de tantas lutas físicas, recebia agora o campeão da palavra, o governador da Guanabara."
 Além da solenidade de formatura, Lacerda tivera encontro, à tarde, com lideranças sindicais e políticas, noCírculo Operário, onde o debate foi aberto aos presentes.


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Visita Histórica: Em dezembro de 1964, o Governador do Estado da Guanabara, Carlos Lacerda, veio aBotucatu paraninfar as professorandos do Instituto de Educação "Dr. Cardoso de Almeida" (ESCOLA NORMAL). Na oportunidade, proferiu palestra no Círculo Operário. Presente, a alta cúpula da UDN: à partir da esquerda, deputado federal Herbert Levy, governador Lacerda, deputado estadual Abreu Sodré e vereador Antônio Delmanto.


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A seguir, algumas opiniões de botucatuenses a respeito do grande político brasileiro, relembrando, já após seu falecimento, a visita que fizera a Botucatu:

Ex-Prefeito Amaral de Barros:"Eu era Prefeito de Botucatu quando o então Governador do Estado da Guanabara, Carlos Lacerda, aqui veio paraninfar as formandas de nossa Escola Normal, em 1964. Juntamente com Antonio Delmanto, proporcionei-lhe uma magnífica recepção. Mais de 140 carros foram esperá-lo no Aeroporto. Quando o avião chegou, dele desceu o alto comando da UDN: Carlos Lacerda, Abreu Sodré, Herbert Levy e Padre Godinho. E eu um político do PSP. A verdade é que como Prefeito de Botucatu, como sua autoridade maior só poderia ter esse procedimento. E o fiz com prazer. Nunca confundi posições político-partidárias com o desempenho da função pública. Na ocasião, Carlos Lacerda brindou-nos com uma magnífica palestra cívica".

 Ex-Presidente do Diretório da UDN, Dr. Antonio Delmanto: "Pude conhecer de perto esse grande líder. Carlos Lacerda representa, tanto quanto Ruy Barbosa e Armando de Salles Oliveira, a inteligência, a cultura e a política brasileira. Ele foi o grande líder nacional após a queda da Ditadura de Getúlio Vargas. Era um homem boníssimo. Fiz várias campanhas com ele, juntamente com Sodré, o Herbert e o Padre Godinho. Com ele participei do Diretório Nacional da UDN. Como ele, comecei na UDN e nela continuei até a extinção dos partidos políticos. Eu como Delegado da UDN de Botucatu, e o meu filho Armando, como Delegado da UDN de Pardinho, em 1965, votamos na Convenção Nacional do partido, em Carlos Lacerda como candidato oficial da UDN à Presidência da República (1966). Lacerda teria sido o maior Presidente do Brasil de todos os tempos. É uma perda irreparável".

 José Augusto Rodrigues (produtor agro-pecuário):"De Carlos Lacerda eu fui amigo. Politicamente sempre segui a UDN. Mas eu não sou político, por isso sempre tive mais relações de amizade do que contatos políticos com ele. Tínhamos amigos comuns. Uma vez preparei a Fazenda Monte Alegre para hospedá-lo. Ele sempre me enviava seus livros e seus discos autografados. Foi um grande brasileiro. Eu o admirava muito."

 Lourenço Ferrari (produtor agro-pecuário): "Quando Carlos Lacerda esteve em Botucatu, oficialmente como Governador da Guanabara, em 1964, eu tive a honra de hospedá-lo em minha casa. A ele e a sua comitiva. Nessa época, o Antoninho Delmanto era meu vizinho. Correligionário de Carlos Lacerda e seu admirador, lembro com saudades os momentos que ele proporcionou a mim e a minha família."
(do livro "Memórias de Botucatu 2", de 1993).


Além dos posts linkados no final, vamos destacar o artigo publicado hoje, 15/04/2014, na “Tribuna da Imprensa online”, pelo jornalista Hélio Fernandes sobre o Centenário de Carlos Lacerda:


“Carlos Lacerda completaria 100 Anos hoje. Amado e Odiado. Personagem de uma época, completamente esquecido. Morreu muito moço.”       Hélio Fernandes.
Foi um combatente nato. Podem dizer dele o que quiserem, contra ou a favor, mas não podem negar a palavra. Podem até interpretá-la, para o bem ou para o mal, só não podem negá-la. Mas apesar de ter sido o personagem de uma época, não saiu, pelo menos até agora o registro do nascimento e morte. E o centenário, data mais do que razoável para lembrar. Nem é necessário ressuscitá-lo, apenas fazer jornalismo.

Em 1931, Pedro Ernesto foi o primeiro prefeito eleito do então Distrito Federal. Grande personagem, administrador notável, foi injustiçadíssimo por Getúlio Vargas. O prefeito era tido e havido como candidato a presidente, se houvesse sucessão nos tempos de Vargas.

Este, como sempre, burlou a Constituição, enganou o povo, devia convocar eleição direta, logo depois da Constituição de 1934. Frustrou o povo brasileiro, se “elegeu” indiretamente, marcou a direta, que também não faria, para 1938. E perseguiu Pedro Ernesto. Acusando-o de “comunista e de ter participado da intentona de 1935”.

Lacerda outro “presidenciável” também injustiçado, sem eleição

30 anos depois, em 1961, Lacerda se elegeu governador do então Distrito Federal transformado em Estado da Guanabara. Foi e é até hoje o mais importante governador eleito. Mas como Pedro Ernesto, não chegou a presidenciável, pela razão muito simples de que para eles não houve sucessão.

Antes dos 18 anos a polícia perseguia Lacerda

Estava no primeiro ano da Faculdade de Direito, não passou daí. Por dois motivos. Não tinha muito interesse em se formar, e precisava ir para Valença, onde a polícia não chegava. Era a casa do Ministro do Supremo, Sebastião Lacerda, avô dele e grande influencia na sua vida.

Lacerda ficava meses lá, devorando a magnífica biblioteca. Vinha raramente ao Rio, voltava para Valença e a cidade de Comércio, hoje Sebastião Lacerda. Um dos melhores livros de Lacerda, tem precisamente esse título: “A casa do meu avô”. Maravilhoso. Impresso em tamanho grande, mil exemplares, distribuídos para amigos.

Tal o sucesso, que lançou em tamanho normal, repercussão total e absoluta.

O ativista, o político, o intelectual, o jornalista, 63 anos de lutas

Não coloquei em ordem, mas o ativista surgiu em primeiro lugar na sua vida. Antes dos 18 anos já polêmico, se envolvia numa discussão pública, “se era ou se não era comunista”. Muitos diziam que era, outros que não. Quando fui diretor da Manchete, ao contrário da revista O Cruzeiro, fazia muitas reportagens com duas ou três páginas. No Cruzeiro, preferiam reportagens com 12 e até 14 páginas.

Os generais da imprensa

Fiz reportagem com esse título, traçando o perfil de todos os importantes donos de jornais. Sobre Lacerda, entre outras coisas, escrevi: “Começou como membro da Juventude Comunista, não se sabe se chegou a entrar para o partidão”. 

Me mandou carta: “Tinha ligações de amizade com membros da Juventude, mas nunca me filiei. Quanto ao partidão, jamais pensei em participar dos seus quadros”. Publiquei, claro, pode ser facilmente encontrada na Biblioteca Nacional.

Em 1945, “cobre” a Constituinte para o Correio da Manhã

Foi quando o conheci e a Juscelino. Lacerda escrevia na segunda página do jornal, com o título: “DA tribuna da imprensa”. Enchia praticamente a página inteira, às vezes sobre política internacional, era uma das suas predileções. Logo depois de promulgada a Constituição deixou o jornal, passou a escrever no Diário Carioca. Não era a primeira vez.

A entrevista com José Américo, derrubou a censura e a ditadura

Em 1943 surgiu o “Manifesto dos Mineiros”, a ditadura embalançou. Mas Vargas reforçou a censura. Em 1944, já criada, (não oficialmente) a UDN, decidiram publicar entrevista com José Américo, homem de grande repercussão, chamado de “vice Rei do Nordeste”. Por que José Américo? É que em 1936, usando Benedito Valadares, Vargas abriu “sua sucessão”, uma farsa, como sempre.

José Américo foi lançado candidato da situação, e Armando Salles de Oliveira, genro do doutor Julio Mesquita e interventor em São Paulo, candidato da oposição. Não houve eleição, claro, surgia a ditadura ostensiva do Estado Novo.

A entrevista, sensacional

Lacerda estava com 30 anos exatos, foi incumbido de fazer a entrevista, que sairia no Diário Carioca. Como é impossível manter segredo, Vargas soube, começou pressão e perseguição colossal contra o jornal. 

Horácio de Carvalho não tinha condições, mas Paulo Bittencourt se apresentou para publicar a entrevista. Foi um estrondo. Vargas sentiu o golpe, mas não “sentiu” que estava no fim. Tentou reagir mas não demorou muito.

Vargas chamou seu Chefe da Casa Civil, Lourival Fontes, um dos homens mais cultos e mais bem preparados intelectualmente, mas sem nenhum caráter, deu a ordem: “Tire os censores das redações e convoque todos os donos de jornais para uma reunião aqui no Catete. Não quero falar com eles, você mesmo, informe: não haverá mais censura, os donos dos jornais serão responsáveis por tudo o que sair. “Essa autocensura”, pior do que a ação do lápis vermelho dos censores.

Começa a carreira política fulminante

Em 1947 se candidata a vereador pelo Distrito Federal. Eram 50. O Partido Comunista elegeu 19, o PTB 12 a UDN 11. Os outros 8 divididos entre partidos pequenos. Foi uma Câmara Municipal extraordinária, eu ia lá todos os dias. Que debates, que divergências, nenhuma hostilidade nem acusações, eram alguns dos melhores oradores e uma época do Partido Comunista inteligente.

A cassação do Partidão

Em 1948 o Partido Comunista deixou de existir oficialmente, todos perderam os mandatos. Mas ninguém foi preso. O grande Sobral Pinto, advogado de Prestes em 1936, e depois grande amigo dele, avisou-o com antecedência, foram para a clandestinidade, era o que faziam de melhor.

Lacerda e Adauto Cardoso renunciaram. E confessaram: “Sem os comunistas a Câmara Municipal não tem o menor interesse ou atração”. Um ano depois lançava seu jornal com o título que usava no Correio da Manhã. Começava fase diferente na sua vida.

Lançado nos últimos dias de dezembro de 1949, Lacerda já combatia a volta de Vargas, em outubro de 1950. Um erro total, como os fatos confirmaram. Lacerda e Golbery, grandes amigos até 64, tentaram evitar a posse de Vargas. Este chamou o general Stilac Leal, que presidia o Clube Militar, nomeou-o Ministro da Guerra, foi empossado.

Os tempos tumultuados

Vargas tomou posse mas não teve um minuto de trégua ou de descanso, e aí não foi por causa de Lacerda. Um ano depois da posse, seu Ministro do Trabalho, João Goulart, dobrou o salário mínimo, foi derrubado por um Manifesto de 69 coronéis. A primeira assinatura era do coronel Amaury Kruel, que teve grande importância.

O suicídio de Vargas

Fato mais importante da República, que nunca foi a dos nossos sonhos, mudou tudo. Mas atingiu até mesmo Lacerda. Assustado, e a conselho de Afonso Arinos se asilou na embaixada de Cuba, cinco anos antes da chegada de Fidel.

A embaixada ficava numa casa pequena na esquina da Avenida Copacabana com Miguel Lemos. Constrangimento rigoroso. O embaixador, paixão por Lacerda, a mulher tinha ódio. Foi para a Europa, ficou um ano, voltou, com a mesma agressividade, agora contra Juscelino.

JK “ajuda” Lacerda

Apesar dos dois golpes de 11 de novembro de 1955, Juscelino consegue se empossar e governar os cinco anos seguidos. Muda a capital em 1960, cria o Estado da Guanabara, marca eleição para 5 de novembro. Lacerda se candidata a governador, se não fosse isso não passaria de mandatos parlamentares. Faz um grande governo, se projeta acima de simples parlamentar.

O golpe de 64

Como já disse exaustivamente, em 1963 com o desfecho no ano seguinte, todos conspiravam: generais, governadores, o próprio ou principalmente Jango. O ano de 63 a partir do referendo de 6 de janeiro, que devolveu todos os poderes a Jango, foi inacreditável. Ninguém sabia o que aconteceria no dia seguinte. Só se soube mesmo a partir de 31 de março, 1º de abril.

Os generais comandaram tudo, eram invencíveis e golpistas, desde que se “apoderaram” e “contaminaram” a República. É possível que os seis governadores mais importantes, todos candidatos a presidente em 1965, tenham dado a impressão de apoiar ou estimular o golpe.

Mas ninguém tinha condições de resistir à ambição e a obsessão pelo poder, publicamente exibida pelos generais.

A Frente Ampla

No início de 1965, Lacerda me disse com ar de lamentação: “O presidente Castelo Branco me chamou e me convidou para embaixador na ONU. Compreendi que não era um convite e sim um veto antecipado a qualquer pretendida candidatura minha a presidente. Recusei na hora”.

Artigo deste repórter, de grande repercussão: “1965, a eleição que não vai haver”. Lacerda disse que era adivinhação

Logo percebi que os golpistas fardados não dariam vez a nenhum civil, principalmente Lacerda. Quando realizei na minha casa (onde moro até hoje) as duas primeiras reuniões, comuniquei e convidei Lacerda. Perguntou: “Quem vai?”.

Falei, o coronel-Ministro da Saúde de Jango, Wilson Fadul, torturadíssimo, o Brigadeiro Teixeira, grande líder da Aeronáutica, o editor Ênio Silveira, tão comunista que seu primeiro filho se chama Miguel Arraes da Silveira, Flávio Rangel, notável jovem que acabara de fazer com Millôr, o maior espetáculo depois do golpe, “Liberdade. Liberdade”, ele me interrompeu, “Eu vou”.

Foi, nenhum deles jamais falara com Lacerda, nem ele conhecia nenhum dos outros. Mas foram quatro horas de conversa que depois se desdobram com Jango e JK, Brizola se recusou.

Sumarizando

O golpe e a tomada do Poder, em 1º de abril de 64, já em 1965 Lacerda recusava ser embaixador na ONU, participava de reencontros com adversários. Todos perseguidos pela ditadura, como podem dar tanta ênfase e importância à sua participação no golpe?

Lacerda só pensava na presidência

Sempre acreditou nisso. Mas 1966, 67 e 68, foram tempos da ditadura contra ele. Quando em 13 de dezembro o locutor Alberto Cury começou a ler na televisão, às 8 e meia, o AI-5 miserável e vergonhoso, comecei a me vestir. Não era horário de sair sozinho, Rosinha perguntou onde eu ia, respondi: “Para o jornal”.

Naquela época não havia nem remota indicação de celular, na porta de saída da minha casa, um telefone. Tocou, Rosinha atendeu, passou para mim, “é o Carlos”. Atendi, disse pra ele, “estou saindo, vou ser preso imediatamente, você talvez seja a única pessoa que eu atendesse”.

Ele: “E eu?”. Respondi, “você vai ser preso e será cassado”. Do outro lado, um berro: “Você está acostumado a adivinhar, não serei preso nem cassado”.

Desliguei, fui para o jornal, logo preso. Levado para o Caetano de Farias. Pensei que fosse o primeiro, já encontrei Osvaldo Peralva, editor do Correio da Manhã, grande amigo, passamos a noite conversando.

Pela manhã, às 9 horas chega Lacerda. Me abraça, diz: “Está bem fui preso, você adivinhou uma parte, mas não serei cassado”.

Isso era 15 de dezembro. No dia 30 Lacerda foi cassado, já não estava mais preso. Eu, Peralva e Mario Lago ficamos até 6 de janeiro, Dia de Reis. Os generais são perseguidores, mas também muito católicos.

No dia 2 de janeiro de 1969, Lacerda viajou para a Europa, teve a gentileza de ir se despedir de nós. Não podia deixar de falar: “Não interessa discutir com você, a não ser que não valha adivinhação”. Ficou 3 anos na Europa, mais de 1 ano em Milão.

A volta e a morte com 63 anos

Chegou ao Brasil, ficou enclausurado na Nova Fronteira, Editora que fundara quando vendeu a Tribuna a Nascimento Brito, por 26 milhões de dólares.

A morte fulminante e silenciosa

Num dia de maio de 1977, a uma da tarde, sentiu dor no coração a família levou-o para o hospital. Por volta das seis foram liberados para irem embora, informaram: “O governador dormirá aqui, para observação”. É obrigatório. 

Quando Letícia e os filhos chegaram em casa, já havia recado para voltarem com urgência. Voltaram, já estava morto.

Tudo o que se “engendrou” depois sobre sua morte, a de JK e a de Jango, fantasia. Não que os generais não quisessem se livrar dos três. Mas não tiveram oportunidade de interferir.

Lacerda que tanto quis a presidência, morreu com 63 anos, sem nunca ter estado doente. Dois anos depois, viria a mistificação que chamaram e chamam até hoje de ANISTIA. Que só ANISTIOU os generais.



Chamem o Lacerda!!!/ leia aqui
Drumond: você não gosta de mim.../ leia aqui

4 comentários:

Delmanto disse...

O Brasil é um jovem país com sua ainda jovem Democracia e com uma população que ainda não sabe cultuar o seu passado e os grandes vultos de sua cidadania. Infelizmente...
Carlos Lacerda foi um político que marcou presença no cenário brasileiro, com capacidade de atuação, coragem, ousadia e muito sonho...
Hoje, esquecido pela mídia que destaca a mediocridade política de um João Goulart e um período do populismo “barato”, bancado pelos “favores” oficiais...É isso.
Lacerda, após a venda do jornal “Tribuna da Imprensa”, montou a bem sucedida Editora Nova Fronteira que foi líder do setor por alguns anos. Seus filhos, Sérgio e Sebastião, não tiveram o desempenho e a garra do pai, nem como empresários e nem no registro de sua trajetória.
Já a terceira geração, com seu neto Rodrigo Lacerda, trás no livro “A República das Abelhas”, um romance “narrado” pelo falecido Lacerda, envolvendo fatos e passagens políticas mescladas com a ficção e resultando apenas num romance razoável. Mas nada de uma releitura necessária desse “vulcão” político que foi Carlos Lacerda. É pena...
Fica o débito de todos nós por um resgate maísculo da rica personalidade desse lutador, como afirma o livro de Dulles, que dedicou sua vida à mudança política com qualidade e civismo.
Com certeza, Carlos Lacerda não foi “un uomo qualunque!”

Anônimo disse...

O Lacerda seria uma “bomba saneadora” nesse mar de lama que se transformou a política brasileira. Haja VERGONHA!
Até o ex-presidente Lula fica se prestando a esse papel “chulé”... Ta certo que ele é meio “fraquinho” no preparo cívico, mas tudo tem limite...Vá de retro satanás!
(p.gomes@yahoo.com.br)

Anônimo disse...

A CORRUPÇÃO é o grande MAL do Brasil. E todos sabem que o ÍCONE DA CORRUPÇÃO é o Paulo Maluf. Se sair do Brasil ele é preso e, no nosso país, ele é deputado federal!!!
Pra se ter uma idéia de como estamos servidos pelos maiores partidos políticos, basta ver as suas alianças! Todos estão envolvidos ou coniventes com a corrupção!
No Governo Federal, o PP de Maluf é ALIADO DO PT!
No Governo de São Paulo, o PP do Maluf é ALIADO DO PSDB!
E agora, José?!?
Socorro! Vamos limpar a Pátria Amada!
Qual a diferença do PSDB para o PT ?!?
Pobre Brasil !!!!!!!!!!!!!!!!!
(luisroberto-souza@yahoo.com.br)

Delmanto disse...

É importante e é prazeroso mostrar as facetas desconhecidas das celebridades que marcaram a vida social, política e cultural do nosso país. E é o que faremos aqui. O poeta Carlos Drummond de Andrade expondo a sua simpatia, a sua amizade e até o seu voto. E o político Carlos Lacerda, ex-governador da Guanabara, escritor, tradutor e editor, com sua admiração explícita ao poeta.

Ambos tiveram efetiva militância política. O poeta, com o tempo, passou a dedicar-se apenas à literatura. Já o político Lacerda, percorreu um logo caminho, travando grandes embates e culminando com sua eleição para governador da Guanabara. Mas no início de suas vidas profissionais, pertenceram à turma de jovens boêmios da famosa “Taberna da Glória”, no Rio, composta porMário de Andrade, Carlos Drummond de Andrade, Rubem Braga, Vinícius de Moraes, Fernando Sabino, Carlos Lacerda, Paulo Mendes Campos e Dorival Caymmi.
E é esse lado do intelectual Carlos Lacerda que eu quero destacar aqui, às vezes ofuscado pelo excessivo desempenho político dele.
Duas matérias que Lacerda preparou para a então famosa revista “Manchete”, ficaram marcadas: as duas ao lado de um piano de cauda: a primeira com Roberto Carlos, , mostrando o lado humano do cantor e, a segunda, com o maestro da Bossa Nova, Antonio Carlos Jobim – o Tom Jobim, poderoso mentor da moderna música popular brasileira. Tanto Roberto Carlos como Tom Jobim se declararam admiradores e eleitores de Carlos Lacerda.
A magnífica tradução que Carlos Lacerda fez do livro “Júlio Cesár”, de Willian Shakspeare e o seu primeiro trabalho literário, em 1934, “O Quilombo Manoel Congo”.
Com a fundação da Editora NOVA FRONTEIRA, Lacerda assumiu a liderança editorial no país, publicando autores nacionais e internacionais, com destaque para o sucesso editorial que foi o DICIONÁRIO AURÉLIO, editado de 1975 a 2004.
Outras obras litrárias de Lacerda: “O Cão Negro”, “Xanam”, “Desafio e Promessa – O Rio São Francisco” e 3 Peças Teatrais inéditas: “O Rio”, “Uma Bailarina Solta no Mundo” e “Amapá ou O Lobo Solitário”.
Carlos Lacerda durante o tempo que viveu em São Paulo, fez parte do Curso de Teatro de Alfredo Mesquita, dando continuidade a essa atividade que desenvolvia desde os tempos de estudante no Rio.
Com a publicação do livro “A CASA DO MEU AVÔ”, revelou-se um intelectual e escritor altamente gabaritado. Foi o ponto alto de sua carreira literária, com reconhecimento positivo da crítica nacional.
Importante o registro desse “outro lado” desse brasileiro inquieto, sonhador, lutador e que conseguia usufruir, em meios às tempestades políticas, momentos de prazer literário e de boêmia saudável...

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