dezembro 06, 2014

OS ANOS 60 NÃO TERMINARAM...




Na segunda metade dos anos 50, o mundo e o Brasil estavam experimentando uma série de novidades...rock estava surgindo e abalava as estruturas conservadoras da sociedade, com mudança de costumes, principalmente entre a juventude. No Brasil, até a música tradicional - o samba! - sofria uma mudança significativa: uma batida diferente. Parecia jazz ou blues... Era a Bossa Nova. Uma nova música, o rock-and-roll mudando os costumes e abalando as estruturas. Elvis Presley, James Dean e a juventude transviada... Eram os novos tempos... 

Na sociedade do após guerra, a palavra de ordem era a reconstrução, a modernidade, a ousadia nos empreendimentos. Novas concepções de espaço e novas posturas arquitetônicas: a Pampulha, em BH e o Ibirapuera, em SP, eram o sinal de geniais profissionais (Burle Marx e Oscar Niemayer) do que seriam os anos 60 com a construção da Nova Capital - BRASÍLIA!



O enfoque que busco da grande transformação pela qual passou o mundo e, de modo especial o Brasil, através da experiência que vivi quer como partícipe ou simples observador registra, de forma mais definida, essa transformação no mundo das artes (teatro e cinema) e da política (com 1968 definindo o início das trevas políticas e o início explícito do autoritarismo militar).

Mas, importantes aspectos da manifestação humana precisam ser abordados, mesmo que rapidamente, para que se tenha a real dimensão dos mesmos e, de certa forma, a interligação entre todos eles a marcarem os anos 60 como a década da transformação mundial.

E surgiram os Beatles e a transformação começava irreversível...

O CINEMA NOVO

cenário é mundial, mas o nosso foco é sempre o Brasil. O chamado Cinema Novo surgiu, em 1955, pela obra criativa e realista do cineasta Nelson Pereira dos Santos. Era uma nova tomada de posição da cinematografia brasileira após a fase "importada e engessada" da Vera Cruz. Nos anos 60 é que o cinema novo teria um crescimento acentuado: até meados dos anos 60, trazendo a realidade brasileira (quase um trabalho de câmera na mão): sua sociedade, as classes emergentes, a favela, a burguesia, a juventude sem rumo... Na segunda metade dos anos 60, os filmes já traziam a problemática política em uma tentativa de desnudar a ditadura vivida pela Nação. À partir de 1968, com a decretação do Ato Institucional nº 5 - AI 5- a Ditadura Militar se impôs, engolindo os militares que participaram do Movimento de 1964 com idéias liberais e, rapidamente e com violência, brecavam a criatividade cultural impondo, de modo brusco, a censura nas artes em geral.



Cinema Novo caracterizou-se pela busca da realidade nacional através de uma linguagem marcada por nossa própria cultura. Após esse período, o "discurso político" perde sua força no cinema novo. Até o início dosanos 70 (de 1968 a 1972) tivemos algumas tentativas de mantê-lo, agora, já sem Glauber Rocha, que em entrevista ao "O Pasquim" decretara o seu fim. Com"Macunaíma", de Joaquim Pedro de Andrade, inspirada na obra de Mário de Andrade, o cinema nacional ainda mostrava a sua vitalidade criativa.



Da mesma forma no âmbito internacional, o cinema mostrara uma nova "cara", com produções como"Barbarella", "Beijos Perdidos", "O Bebê de Rosemary", "La Dolce Vita", "O Planeta dos Macacos", "Romeu e Julieta" (Zefirelli) e "Teorema"entre outros.

A REVOLUÇÃO NO TEATRO NACIONAL
teatro brasileiro vem desde os primórdios da colonização portuguesa. Mas só nos anos 50, começa a tomar forma a retratar a sociedade paulista com Jorge de Andrade enquanto Ariano Suassuna inova no teatro regional. Em 1948, Alfredo Mesquita funda a Escola de Arte Dramática - EAD, em São Paulo Maria Clara Machado, em 1950, abre o Tablado, no Rio de Janeiro.

No final da década de 50 e início dos anos 60, a prioridade do então poderoso TBC - Teatro Brasileiro de Comédia para as peças e autores estrangeiros, leva os autores e atores nacionais a procurarem outro caminho vendo, no teatro, um meio válido para buscar a transformação da sociedade brasileira.

Revolução Cultural do Teatro Brasileiro, na década de 60, a nosso ver, está marcada pela atuação teatral e política de dois grupos teatrais: o TEATRO DE ARENA, de São Paulo, sob a direção de Augusto Boal, Gianfrancesco Guarnieri e Oduvaldo Vianna Filho; e o GRUPO OPINIÃO, do Rio de Janeiro, sob a direção de Paulo Pontes , Oduvaldo Vianna Filho, Armando Costa. Na verdade, atuavam em perfeita simbiose.

SHOW OPINIÃO – LIBERDADE/LIBERDADE/ MORTE E VIDA SEVERINA

Em 1965, assistimos no Rio de Janeiro apresentação revolucionária do "Show Opinião", com Zé Kéti, João do Vale e Maria Bethânia (substituindo Nara Leão). Era a estréia da novata Maria Bethânia no teatro. A sua interpretação dramática e a força que ela impôs à personagem repercutiram por todo o país: nascia uma estrela ímpar! Os autores do espetáculo, Armando Costa, Oduvaldo Vianna Filho e Paulo Pontes deixaram claro que "...é preciso restabelecer o teatro de autoria brasileira - não somente o teatro do dramaturgo brasileiro - o espetáculo do homem do teatro brasileiro. É preciso que finalmente e definitivamente nos curvemos à nossa força e à nossa originalidade".

Com direção geral de Augusto Boal direção musical de Dorival Caymmi Filho, o espetáculo trazia a música de Zé Kéti e João do Vale em cima de ampla pesquisa na autêntica música popular brasileira.

No mesmo ano de 1965, ainda no Rio, numa promoção do Teatro de Arena/Grupo Opinião, assistimos a apresentação de "Liberdade, Liberdade", peça de Millôr Fernandes e Flávio Rangel, era o chamado teatro de protesto, criticando o movimento militar de 1964. A peça estreou no dia 21 de abril, Dia de Tiradentes. Era emblemática. Com Paulo Autran, Tereza Rachel, Nara Leão e Oduvaldo Vianna Filho.


"Liberdade.Liberdade", reunia textos de vários autores sobre o tema-título: Sócrates, Marco Antônio, Platão, Aristóteles, Abraham Lincoln, Martin Luther King, Castro Alves, Vinicius de Moraes, Anne Frank, Danton, Winston Churchill, Cecília Meireles, Geraldo Vandré, Jesus Cristo, William Shakespeare e Carlos Drumond de Andrade.

Na sequência, ainda em 1965, mas agora em São Paulo, assistimos a peça "Morte e Vida Severina", baseada no livro do mesmo nome do poeta João Cabral de Melo Neto, retratando a vida de um retirante que desce do sertão nordestino ao litoral em busca de uma vida melhor. A peça foi montada a pedido do escritor Roberto Freire, Diretor de teatro da PUC/SP. Era o TUCA (Teatro da Universidade Católica) a marcar a sua presença pela história do teatro brasileiro. Os poemas foram musicados por Chico Buarque de Hollanda. A peça representou o Brasil no Festival de Nancy/França, onde arrebatou o maior prêmio.

Na segunda metade dos anos 60, a realidade política brasileira já estava mudada. O regime militar que se instalara no Brasil em 1964 recebera, no início, apoio expresso da sociedade brasileira (marcha dos cem mil) preocupada com os desmandos e falta de rumo seguro do Governo de João Goulart. Após a fuga do presidente,toda a classe política apoiou a eleição do Marechal Castelo Branco, para Presidente do Brasil, inclusive o PSD, de Juscelino Kubischeck, que por iniciativa do ex-presidenteindicou seu primo e correligionário José Maria Alckmin para o cargo de Vice-Presidente da República do Brasil.

O que veio depois já é uma outra história. É o Golpe Militar no Governo Provisório Militar. É a linha dura se impondo. É o AI - 5 , o Ato Institucional nº05. É o obscurantismo, as trevas. A tortura, a cassação de mandatos, a perseguição aos docentes das universidades, a castração política... E o surgimento da Frente Ampla a favor da volta do país ao Estado de Direitosob a liderança de Carlos Lacerda, Juscelino Kubischeck e João Goulart.

RODA VIVA – O BALCÃO

Duas peças marcaram esse período extremamente difícil da vida nacional: "Roda-Viva" e "O Balcão", a primeira em 1968 e, a segunda, em 1969.

A peça Roda-Viva, escrita, em 1967, por Chico Buarque de Hollanda, fez sua estréia no ano de 1968, no Rio de Janeiro. Assistimos a montagem feita em São Paulo, também em 1968, na Sala Galpão do Teatro Ruth Escobar. Com Marília Pêra, André Valli e Rodrigo Santiago. Com direção de José Celso Martinez Correa e figurinos de Flávio Império

No decorrer do ano de 1968, o CCC - Comando de Caça aos Comunistas invadiu o teatro, espancou os artistas e depredou o cenário. No ano seguinte, a peça Roda Viva foi para Porto Alegre onde sofreu nova investida do CCC. Após o segundo ataque, deixou de ser exibida.

Foram os anos de chumbo da vida política e cultural do Brasil. A sociedade sofrera esse impacto de tão grande magnitude que nunca mais seria a mesma edeterminaria as mudanças pacíficas na sociedade brasileira com o Movimento das Diretas Já! e a redemocratização do país ainda em curso.



Em 1969, a encenação apoteótica de "O Balcão", peça do dramaturgo francês Jean Genet, que esteve em São Paulo assistindo a montagem feita por Ruth Escobar, com direção do argentino Victor Garcia que com muito vanguardismo e teatralismo monta "O Balcão" em uma ousada produção remodelando radicalmente a arquitetura interna do Teatro Ruth Escobar. Uma peça alegórica, cheia de referências metateatrais, escrita em 1957. Com cenas de simulação de sexo, nu frontal, juízes e bispos sendo currados sexualmente, segundo o crítico Lourenço Cavalcanti

Os autores: Raul Cortez, Célia Helena, Claudio e Sergio Mamberti e Dionísio de Azevedo. Raul Cortezfazia o primeiro nu frontal do teatro brasileiro. A peça representou uma época de grandes transformações políticas, sociais, culturais e sexuais...Uma das atrizes foi presa acusada de ter dado abrigo a Carlos Lamarca. A luta armada começava com a Aliança Libertadora Nacional - ALN: era o começo da guerrilha no Brasil. O AI -05 imperava...

efervescência cultural no teatro brasileiro, entre tantas manifestações de grupos teatrais por todo o país, concluiu essa década de criação e revolução cultural com o grandioso espetáculo "HAIR", em 1970. Montado no Teatro Aquarius (Zaccaro), no Bairro do Bixiga.

Esse "musical rock" marcaria definitivamente o teatro brasileiro. Após seu grande sucesso na Broadway, nos EUA, nos últimos anos dos anos 60, estreava sob grande espectativa, em 1970, em São Paulo.

A montagem do musical no Brasil requereu grandes esforços do produtor Altair Lima e do Diretor Ademar Guerra. De início, a descrença dos empresários em apostar em um espetáculo dessa magnitude e, também, o cerco da censura. O AI - 05 estava a mais de um ano em vigor... 
Baseado no livro de poemas líricos de James Rado e Gerome Ragni, tinha músicas de Galt MacDermot. Produto hippie da "age of Aguarius", representava a contra-cultura e a revolução sexual dos anos 60.



Era a história de uma "tribo", os "hippies da age of Aguarius", politicamente ativos, com seus cabelos longos e roupas típicas e despojadas a lutar por suas vidas, seus amores e pela liberdade sexual que estava chegando. Com a rebelião da "tribo", eles se posicionavam contra o recrutamento para a Guerra do Vietnã e contra o conservadorismo de seus pais e da sociedade americana.

Com grande elenco, revelou inúmeros atores: Armando Bogus, Sônia Braga, Maria Helena, Altair Lima, Laerte Morrone, Aracy Balabanian, Bibi Vogel e, na sequência de novas montagens, Antonio Fagundes, Nuno Leal Maia, Ney Latorraca, Denis Carvalho, Buza Ferraz e Wolf Maia.

OS ANOS 60 NÃO TERMINARAM...



8 comentários:

Anônimo disse...

Oi, Armando. Muito boa essa viagem no tempo. Boas lembranças para todos nós. O país vivia um desenvolvimento grande e o povo estava com um “pique” bem positivo. E o nosso João Gilberto começava a conquistar a juventude com seu ritmo diferente e envolvente. Chega de Saudade, Garota de Ipanema, O Barquinho, Samba de Uma Nota Só, Desafinado, O Pato e tantas outras musicas inesquecíveis. Seguramente foram os “Anos Dourados”... Um “revival” seria bom... (carla.bueno2011@bol.com.br)

Delmanto disse...

“Edi Cavalcante disse...
Oi, Delmanto,
nada como experiências vividas, sentir no momento do acontecimento o impacto primeiro, inícios de novas eras. Acho muito legal conhecer as impressões pessoais de cada um. Tantas coisas fundamentais que aconteceram, que fica difícil compilar em um blog. Mas você faz isso de forma muito viva. E agradeço por participar do seu blog.
Um abraço,
e.c./impressões dos anos 60”
O blog do Delmanto não poderia deixar de reproduzir a opinião abalisada do EDI CAVALCANTE, feita para o post “Chega de Saudade”
BLOG DO DELMANTO

Anônimo disse...

Quem gostava dos vozeirões do Orlando Silva, do Francisco Alves e do Jorge Goulart, começou a ver que a música não precisa ser cantada no tom mais alto. A boa música, com letra inteligente e bem cantada é uma boa. Com letra de Tom Jobim e letra do “poetinha” Vinicius de Moraes, a música “Chega de Saudade” só poderia impactar de forma total. Eu vivi essa época e dei os meus primeiros passos nos bailinhos do colégio. Tocava violão, mais ou menos, mas conseguia muito bem fazer o acompanhamento das músicas da bossa nova. E a meninada gostava. Tocar violão já era um plus...Belos tempos, belas lembranças... (jair.castro66@yahoo.com.br)

Delmanto disse...

1968: O ANO QUE NÃO TERMINOU...
Não terminou... As conseqüências das mudanças culturais, políticas, sexuais e sociais continuam a ser sentidas em todo o mundo.
Terminou, talvez, o ímpeto da juventude a impulsionar as mudanças. Com a UNE se atrelando da forma mais despudorada ao Governo Federal, recebendo verdadeiras fortunas e abandonando a liderança estudantil... É preciso novas e urgentes manifestações da cidadania. No mundo todo temos visto – mobilizados pelas redes sociais da internet! – os Indignados da Espanha e da Europa e o movimento “Anti-Wall Street” a condenarem o CAPITALISMO PRIMATA e propugnando para ele um “banho” de humanismo. Até o presidente Obama já criticou a DITADURA FINANCEIRA DE WALL STREET que privilegia a ESPECULAÇÃO FINANCEIRA e sacrifica gerações e gerações de norte-americanos, condenados ao desemprego e à falta de perspectiva futura. Por aqui não é muito diferente...
Sim, é preciso que a juventude seja a propulsora certa das mudanças que ainda virão e das mudanças que precisam ser completadas. Afinal, nem tudo são flores...O mundo espera por mudanças que elevem a cidadania e dignifiquem o ser humano.
O Brasil vive um momento muito especial.
O momento é de MUDANÇAS ESTRUTURAIS!
O momento é de MUDANÇA DE ERA!
O momento é de MUDANÇA CIVILIZATÓRIA!
Atenção! A postos! Avante!!!

Anônimo disse...

É grave a realidade atual, porque os jovens usam a “cola” fácil da internet (Google) como se fosse a coisa mais natural...e não é! Exatamente isso: a atrofia-intelectual, esse o maior perigo. Fora a linguagem da preguiça, porque também é muito fácil abreviar drasticamente as palavras e, num primeiro momento, até engenhoso e “bonitinho”, mas não tem retorno. Sem retorno, na progressão da gramática e da literatura. E isso vai levar, inexoravelmente, à dificuldade de arrumar um bom emprego e, se tiver QI e arrumar emprego, a dificuldade em se relacionar com o mundo real no dia a dia, com os problemas que surgem e que terão que ser resolvidos por eles mesmos.
Cabe à nossa geração, aos pais dos adolescentes e, muito principalmente, aos professores uma orientação positiva e inteligente na indicação de boas leituras, o que nem sempre acontece. A hora que o jovem descobre o prazer de ler um bom livro, ele saberá conviver muito bem com o mundo virtual e com a construção de sonhos que os livros nos dão.
Um artigo na internet, deixa clara uma advertência:
“...não se pode pensar e tuitar ao mesmo tempo, não por ser impossível fazer tarefas múltiplas, mas porque tuitar – que é, em grande parte, um jorro, ou de opiniões breves sem sustentação, ou de descrições breves das próprias atividades prosaicas – é uma forma de distração e anti-pensamento.”
Ora, quer dizer que NÃO é impossível “fazer múltiplas tarefas”, mas há que se ter o discernimento do que se faz, sob pena de se ficar, sim, apenas no “jorro de opiniões breves sem sustentação”...
É caso para se pensar e, talvez e por quê não, depois surgir uma idéia ousada que modifique positivamente a sociedade, o inter-relacionamento dos jovens, enfim, uma potente luz radiante a inundar o fim do túnel! Vamos pensar!!!
(bastosgustavo@yahoo.com.br)

Anônimo disse...

Jo Sant'Iago compartilhou a foto de Armando Moraes Delmanto.

Revendo a nossa história mais recente ...

Anônimo disse...

Silvio Poggi Nunes (Facebook):
Armando acho bom analisamos o enterro da família e cultura latina pelos bárbaros e vândalos nórdicos de um lado e hunos e mongolóides de outro! Capisce mio caro?
E a idade da treva sarracena querendo se aproximar
Eu prefiro aquele livro de 1958 do que esse de 19681
ano horrível

Anônimo disse...

Ana Coneglian Leccioli (Facebook):
Os anos 60 foram mágicos!!!

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