março 09, 2016

ALBERTO MORAVIA: o retratista da "alma italiana"


Alberto Moravia de 1934 até os Contos Romanos...


Alberto Moravia (1907/1990) foi o “retratista da Alma” do italiano no século XX. Soube captar toda subjetividade e liberdade que cada um de nós tem para escolher os seus caminhos e os conflitos resultantes dessa escolha... Mostra, sem dúvida, a importância da existência individual.Moravia é considerado um dos pioneiros do EXISTENCIALISMO, mas de uma forma mais intuitiva, diferente de Camus e Sartre, embasados filosoficamente.





Com seus “CONTOS ROMANOS” e “NOVOS CONTOS ROMANOS”Alberto Moravia conquistou o público italiano e dos principais países ocidentais. Hoje, já é famosa a sua perda do Prêmio Nobel. Sim, já era pacífica a sua escolha, em 1958. Mas o mundo estava dividido pela Guerra Fria, e num trabalho debitado à C.I.A., o grande prêmio dedicado à literatura foi entregue à BORIS PASTERNACK pela obra “DOUTOR JIVAGO”, que fora impresa rapidamente e entregue à Academia Sueca pela famosa agência norte-americana.. Moravia era do PCI – Partido Comunista Italiano, tendo sido eleito para o PARLAMENTO EUROPEU, em 1984 até seu falecimento em1990.

Mas Alberto Moravia imperou nos decênios seguintes com sua prosa envolvente e pelo perfil que traçava de uma sociedade em mutação e excessivamente presa a valores do consumismo exagerado e do formalismo social, sempre hipócrita e superficial.

Grande representante da literatura ocidental, Moravia ficou mais conhecido pelos filmes baseados em seus romances: “O Conformista”, filmado por Bertolucci; “O Desprezo”, filmado por Jean-Luc Godard e "Os Indiferentes", filmado por Vittorio de Sica.

1934






“Acredito que a criação humana é universal”, disse ele numa entrevista. “Qualquer homem possui uma capacidade criadora, nunca desprezível e incessante. A todo o instante se pode encontrar no interior de qualquer homem, por mais insignificante que seja, a sua força criadora. E isso é que é belo.”



O livro “1934” é emblemático e nos mostra que as decisões individuais para solucionar problemas existenciais recebem a influência externa e de outras pessoas e o resultado pode ser exatamente o contrário da intenção inicial. Na foto acima, Moravia e Elsa Morante na Ilha de Capri, nos anos 40.Para que se tenha uma perspectiva desta importante obra, a crítica literária de NEI DUCLÓS, escrita para o “Jornal Opção” precisa ser conhecida e analisada:

Nei Duclós
Especial para o Jornal Opção


“1934” é um romance de Moravia que trata de um leitor compulsivo, escritor obcecado em alguns grandes autores que busca uma saída para o inevitável suicídio. “É possível viver no desespero sem desejar a morte?” é a primeira frase que nos leva para o abismo. Inspirado na obra radical das gravuras e quadros de Albrecht Dürer e no Nietzsche de Zaratustra, ele se divide entre a dor e o prazer, trafegando num fio de navalha a partir de uma ilusão: o namoro com uma bela turista alemã casada. Ele procura dominar o desespero para equilibrar-se na difícil Europa de domínio fascista. Revela a intelectualidade de mãos amarradas e de raciocínio podre, a serviço do imobilismo do gesto e do marca passo das ideias.
O jovem Lucio, o escritor que viaja a Capri para produzir algo que resolva seu paradoxo, entra no jogo de sedução cedendo a um impulso, mas sua intervenção obedece a um intuitivo planejamento. No fundo ele quer amarrar a súbita paixão ao confortável desfecho de sua aventura. Mas é traído pela complexidade da trama. A mulher do seu desejo tem uma outra, idêntica, irmã gêmea que se confunde com ela, apesar das personalidades opostas (o convívio com uma o liberta das amarras com a outra e vice-versa). Isso faz com que o jogo de cabra cega com o gênero oposto vire uma armadilha, intensificada pela presença do marido, um alemão nazista que o obriga a fazer a saudação maldita de braço estendido.
Submeter-se às conveniências para sobreviver é a fonte do desespero, fruto da escravidão. O escritor não pode se manifestar porque a situação política que ultrapassa fronteiras não permite. Em 1934 o ambiente já estava definido a partir da morte e sua celebração, consolidada no Viva La Muerte da futura guerra espanhola naquela década. A criação estava confinada ao oposto de sua natureza. Moravia escreveu sobre esse pesadelo de 1934 só muito mais tarde, na década de 1980. O romance tem tudo de um resgate a partir das ruínas. Criaturas demolidas pela situação insuportável imaginam amar, pensar, gerar um destino diverso do que está sendo imposto. “Acredito que a criação humana é universal”, disse ele numa entrevista. “Qualquer homem possui uma capacidade criadora, nunca desprezível e incessante. A todo o instante se pode encontrar no interior de qualquer homem, por mais insignificante que seja, a sua força criadora. E isso é que é belo.” Mas neste romance a beleza fica sufocada, apesar da maestria do texto, sempre encantadora.
Longe do panfletismo, o rigor de Moravia joga pesado na confluência de intenções contraditórias, nas vontades que se anulam, nas decisões erradas, no imaginário promovido pela iminência da guerra. Tudo é delicado nos detalhes dessas rotinas vulneráveis, em que os bilhetes podem levar a um assassinato, uma leitura consegue destruir carreiras, uma paixão de verão acaba virando um caso sinistro. Em que sombras definem a vontade de sumir e todo esforço bate na barreira de uma realidade intransponível. Estávamos estrepados em 1934 e parece que saímos daquela gruta. Mas ele prepara uma surpresa.”

HISTÓRIAS DA PRÉ-HISTÓRIA


Neste livro, Alberto Moravia reinventa a pré-história e cria algumas dezenas de contos, em diversos sentidos, fabulosos. Num deles, por exemplo, descobrimos a origem das lágrimas de ´Croco Dilo´; em outro, por que o ´Cama Leão´ muda de cor; ou ainda como ´Ba Leia´ deixou de ser um pequeno peixinho e como o unicórnio se transformou em ´Rino Ceronte´. Nesse universo de pernas para o ar, em que a fantasia dita as normas, a ´Pre Guiça´ pode ser chefe do corpo de bombeiros, o ´Can Guru´ quer se comunicar com os homens e estes, bem, estes... desfrutavam sem compromisso das delicias do ´Jardim do Eh Dehn´. Estas histórias, ainda que repletas de animais, não podem ser chamadas simplesmente de fábulas, porque Moravia não quer, como La Fontaine, dar lições de moral. Antimoralista convicto, as fabulas de Moravia são antifábulas ou fábulas pelo avesso. Ao subverter a expectativa e até a lógica das histórias infantis, estas narrativas colocam o leitor (seja ele criança ou adulto) diante de um universo rico e desafiador. O mesmo procedimento esta presente no modo como o autor utiliza os provérbios, ora alterando-lhes o sentido, ora simplesmente mostrando que nem sempre eles correspondem a verdade. As antifábulas de Moravia seguem contra a correnteza, e buscam revelar não como as coisas aconteceram, mas como poderiam ter acontecido...
Uma girafa órfã que acredita ser um leão. Um pinguim professor de geografia que pensa que o gelo é eterno. Uma pulga que desafia um dinossauro a saltar mais do que ela. Uma morsa cujos pensamentos congelam no ar e um javali apaixonado por um peixe.
Era uma vez um tempo antes do tempo, quando tudo ainda estava por fazer e a História, por inventar. Nas 24 divertidas histórias deste livro, o grande escritor italiano Alberto Moravia vira tudo pelo avesso, deixa as fábulas de ponta-cabeça e nos leva a olhar o mundo como ele é, sonhando com aquele que poderia ser.

2 comentários:

Anônimo disse...

Nos dois anos em que fiz pós-graduação em Bolonha, Itália, pude sentir o quanto o italiano se identificava com Alberto Moravia. Retratando sempre o cidadão de Roma, Moravia, na verdade, retratava o italiano contemporâneo. De Trento a Polignano a Mare (terra de Domenico Modugno), na Puglia!!! Todo italiano vibrava com a prosa mágica de Moravia.
Muito bem lembrado. Alberto Moravia é um dos ícones da literatura ocidental.
(adv.marcelo.delmanto@gmail.com)

Anônimo disse...

Caro amigo Armando Moraes Delmanto,

Ótima a lembrança do grande contista italiano Alberto Moravia. Seus contos são excelentes! Tomei conhecimento de toda a sua obra, graças à doação que você fez ao Centro Cultural. Um dos grandes retratistas da sociedade italiana, onde descreve o viver do povo romano. Lembra-me Steimbek,cuja obra descreve os acontecimentos da grande depressão americana.

Olavo Pinheiro Godoy (Membro Efetivo da ABL – Academia Botucatuense de Letras)

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