O que que dizer?
Isso é latim?!?
É latim, sim! Quer dizer “NÃO MORREREI DE TODO – COMPLETAMENTE”...
Uma ACADEMIA DE LETRAS é
sempre o resultado de várias somatórias de esforços de intelectuais que se
dedicam às letras e à literatura e ao estímulo às artes e às ciências.
Assim, a ACADEMIA
BOTUCATUENSE DE LETRAS TEM A SUA HISTÓRIA...
Botucatu é conhecida por
ser um centro irradiador de cultura, tradicional por suas escolas e pela
atividade cultural de seus filhos. A presença de Grêmios Literários, estudantis
ou não, a presença destacada da Sociedade Literária de Botucatu, nos anos 30,
estão a atestar que desde essa época a nossa cidade era campo propício ao
surgimento de uma ACADEMIA. E foi o que ocorreu em 1936. Foi a primeira
tentativa, de um total de três, de criação de uma ACADEMIA DE LETRAS em
Botucatu.
A 1ª tentativa ocorreu a 7
de agosto de 1936, mas não completou 2 anos.
A 2ª tentativa ocorreria 22
anos depois, em 1958. Já contando com o apoio do Centro Cultural de Botucatu,
fundado a 6 de agosto de 1942. Também não durou muito. Finalmente, a 3ª
tentativa, em 9 de Julho de 1972.
Vitoriosa e definitiva!
Mas da 2ª tentativa, ficou
o lema da ABL: NON OMNIS MORRIAR!
Dom Melhado
UM LEMA PARA A ACADEMIA BOTUCATUENSE DE LETRAS
'Non
omnis moriar'
"Está ainda em organização a Academia Botucatuense de Letras. A
Diretoria Provisória, sob a digna presidência de Trajano Pupo Jr., com a
colaboração dos demais membros, está estudando a redação definitiva dos
Estatutos e do Regimento Interno.
Trajano Pupo tomando posse na ABL em 1972
Outros assuntos basilares e de natureza
jurídica estão sendo examinados e discutidos democraticamente. Tudo vai bem, e
nos dá a esperança de que, brevemente, nossa promissora Academia estará
funcionando perfeitamente, congregando e estimulando, como convém, os cultores e
admiradores das letras pátrias.
Entre outras coisas, procura-se dar um lema para a Academia.
Esta escolha foi confiada a uma comissão de quatro membros - Cintra, Novelli,
Paulo Vieira e o autor destas linhas - . Ficou decidido que deve ser um texto
latino de duas ou três palavras apenas, mas que encerre um programa, um ideal.
Aventou-se também que tenha uma cor local ou regional. Não é coisa fácil,
entretanto.O Prof. Cintra, o conhecido "Racy" da "Folha", bom latinista, apresentou uma relação de mais duma dezena de motes latinos, todos aproveitáveis. Como é natural, os gostos variam. Uns se simpatizavam mais por este, outros por aquele anexim. Também eu tenho o meu gosto. Da lista do "Racy", meu voto é para o "non omnis moriar" (não morrerei de todo-totalmente). Aqui vão algumas considerações para justificar minha preferência.
O presente texto é extraído da Ode XXX do Livro III do imortal poeta latino Horácio, que a dedica a Melpômene. Para sua melhor compreensão, convém examinar o texto junto ao contexto. O poeta, pouco modesto, faz o elogio de sua própria obra literária. Diz ter construído "um monumento mais duradouro que o bronze, mais alto que as pirâmides, que nem os aguaceiros devoradores, nem o feroz Aquilão, nem a força dos séculos, nem a voragem dos tempos conseguirá derrubar por terra". E vem, então, a afirmativa: "non omnis moriar" - não morrerei totalmente -, e acrescenta: "grande parte de mim escapará à morte, e meu nome irá crescendo entre coros de aplausos das gerações vindouras..." Os versos continuam no mesmo ritmo, mas já temos o suficiente para entender o pensamento horaciano.
O poeta pretende sobreviver a si mesmo nos versos que compôs. E sua profecia cumpriu-se literalmente. Morto oito anos antes do advento de Jesus Cristo, Horácio está ainda bem vivo entre nós, graças à sua obra monumental. Perenes como o bronze, elevadas como as pirâmides, indomáveis diante da fúria dos ventos e da ferrugem dos séculos, aí estão, para nosso deleite literário, hoje, como há vinte séculos, as Odes, os Epodos, as Sátiras, as Epístolas e a Arte Poética do grande e imortal Quintus Horacius Flaccus.
Mas, poderão perguntar meus pares, que tem isso que ver com a nossa Academia? Tem que ver o seguinte: Costuma-se dar aos acadêmicos o epíteto de "imortais". Não consegui desvendar a razão deste pomposo título. Entretanto penso que talvez se pudesse encontrar a causa deste apelativo na "imortalidade" de que fala Horácio em sua Ode. Os grandes acadêmicos escreveram obras imperecíveis que projetaram seus nomes pelos séculos futuros, até nossos dias. Mais expressivos que os nomes dos conquistadores são os de Sócrates, Platão, Virgílio, Milton, Goete, Dante, Camões, Rui Barbosa, porque
"Renome e glória, bem o ganha a escapar;
Mas conservá-lo só o pode a pena."
(Garret, no poema "Camões")
É verdade que os acadêmicos de Botucatu não podemos pretender tais louros imarcescíveis. Vai nisto, porém apenas uma longínqua analogia. Já que aceitamos o nome de Academia para o nosso modesto cenáculo das letras não nos podemos furtar à alcunha de Imortais dada aos acadêmicos. E, se o "nom omnis moriar" se tornar insuportável à nossa modéstia, lembramo-nos de que a divisa não nos pertence individualmente, mas sim à Academia como êmula mirim das velhas e grandes Academias.
Ainda há uma outra justa e honrosa ressalva.
Embora Horácio tenha sido um poeta pagão, abriu margem, em seus versos, a uma interpretação profundamente cristã e teológica. Dizendo que não morrerá totalmente, está afirmando a imortalidade da alma. Todo cristão tem direito a dizer, em verdade, o seu"non omnis moriar". Todo homem morre, mas não morre o homem todo. O que tem de maior e melhor, a alma, escapará à morte.
Aqui ficam, pois, estas considerações como sugestão apresentada aos "imortais" e, particularmente, aos três que, comigo, deverão decidir da escolha da epígrafe da Academia Botucatuense de Letras.
Monsenhor Melhado".
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