SOBRE MÉDICOS E ADVOGADOS
Roberto Delmanto
Voltaire, o grande escritor francês que reabilitou Callas, injustamente condenado à morte e executado sob a acusação
de ter assassinado em Toulouse, cidade maciçamente católica, o próprio filho
por ter este se convertido ao protestantismo, considerava a advocacia a mais
bela das profissões. Uma única outra, penso, pode com ela rivalizar-se: a
medicina.
Alguns de nós tem ou tiveram o privilégio de possuir em suas
famílias médicos e advogados. Eu, como criminalista, tive a sorte de, durante
vinte e três anos, receber lições técnicas, morais e éticas de meu pai Dante Delmanto. O Des. Otávio Augusto de Almeida Toledo também
teve como mentor seu pai, Antonio Augusto
de Almeida Toledo, carinhosamente chamado de Toledinho, que pontificou na advocacia criminal uma geração após a
do meu.
Ambos igualmente tivemos parentes médicos a nos dar exemplos de
abnegação e humanidade. Aleixo Delmanto,
irmão de meu pai, vivendo em Botucatu, no interior paulista, foi um grande
clínico e radiologista. Formado na Itália, seu poder de diagnóstico era tão
formidável que, às vezes, ao encontrar um conhecido na rua, só pelo olhar
deste, sabia que não estava bem, pedindo que no dia seguinte fosse ao seu
consultório.
Antônio Delmanto, outro irmão de meu pai, na mesma cidade foi um renomado
cirurgião-geral. Esteta, ao operar o apêndice de uma jovem fazia-o com tal
perfeição que precisava dar apenas um ponto. Como este, após alguns anos
desaparecia, um novo médico que a examinasse não acreditava que ela já tinha
sido submetida àquela cirurgia.
Otávio, a seu turno, teve como avô materno o notável clínico e cirurgião Vicente Zamitti Mammana. Sua apurada
técnica fêz escola e deixou inúmeros discípulos. Como Secretário da Saúde,
revelou-se excelente administrador e manteve ilibada sua reputação.
Homem de coragem, certo dia, no Corpo de Bombeiros de São Paulo,
estando presente com outras autoridades e oficiais da corporação, inaugurava-se
uma moderna cama elástica para salvar vítimas em prédios. No último andar do
edifício, entretanto, os soldados hesitavam em saltar para experimentá-la, até
que o Dr. Vicente, ele mesmo, para surpresa de todos, repentinamente saltou sob
calorosos aplausos.
Médico benemérito, costumava dizer que, muitas vezes, Cristo
aparecia nas enfermarias dos hospitais. Advogado há 50 anos, acredito que, em
algumas ocasiões, ele também apareça em nossos Fóruns e Tribunais, a humanizar
a aplicação da lei penal...
Roberto Delmanto é advogado criminal, autor dos livros Código Penal Comentado, Leis Penais Especiais Comentadas, A Antessala
da Esperança, Causos Criminais e Momentos de Paraíso – memórias de um
criminalista, os três primeiros pela Saraiva
e os demais pela Renovar.
Artigo publicado no jornal “Carta Capital”, de abril de 2017.
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